Algoritmo projeta futuro das espécies da Amazônia
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Algoritmo projeta futuro das espécies da Amazônia
Pesquisadores desenvolvem modelo capaz de prever transformações na floresta causadas por condições climáticas adversas

Com o objetivo de projetar as estratégias de sobrevivência de espécies amazônicas em vista de condições climáticas adversas, pesquisadores da Unicamp desenvolveram um algoritmo capaz de realizar previsões potencialmente úteis. Chamado Caetê, termo em tupi-guarani que significa “mata virgem” e sigla para CArbon and Ecosystem functional-Trait Evaluation model (modelo para avaliação de características funcionais de carbono e de ecossistema), a ferramenta tem a vantagem de considerar uma diversidade vegetal maior do que outros algoritmos do tipo, o que resulta em previsões mais próximas da realidade.

Se nada for feito para que as emissões de gases de efeito estufa sejam reduzidas, a temperatura do planeta poderá aumentar 3,2ºC até 2100, de acordo com as previsões do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês). Parece pouco para a sensação térmica cotidiana, mas a mudança nos padrões de chuvas deve afetar o funcionamento de ecossistemas, como a Amazônia, de forma irreversível. No entanto, não é possível apontar uma única consequência geral que as mudanças climáticas podem trazer à floresta. Cada uma das milhares de espécies vegetais desenvolve suas próprias estratégias de sobrevivência, dando origem a uma nova configuração da vegetação.

“A maioria dos algoritmos desenvolvidos até o momento simplifica a diversidade da Amazônia a cerca de três tipos de plantas. Nós incluímos 3 mil tipos em nosso sistema”, explica Bianca Rius, doutoranda do Instituto de Biologia (IB) da Unicamp e uma das desenvolvedoras do Caetê. O sistema cruza dados referentes a condições climáticas, como precipitação, incidência de luz solar eníveis de gás carbônico na atmosfera, com diferentes características e estratégias de sobrevivência desenvolvidas pelas diversas espécies.

Assim, o algoritmo oferece respostas sobre como o ecossistema se adaptaria em diferentes condições e o que nele se alteraria, como as taxas de fotossíntese e os locais em que as plantas passariam a estocar mais carbono. A partir da combinação de diferentes dados, o algoritmo pode simular o ponto em que a Amazônia não conseguiria mais recuperar suas características originais.

O recurso pode ser aplicado também em outros biomas brasileiros, como a Mata Atlântica e o Cerrado, e ainda em florestas temperadas. “Tudo depende de como calibramos o modelo por meio das características que incorporamos ao algoritmo”, detalha Bárbara Cardeli, também doutoranda do IB e desenvolvedora do algoritmo. De acordo com as pesquisadoras, as informações referentes às espécies são extraídas de estudos realizados na floresta. Já os dados climáticos são baseados nas projeções do IPCC.

A ideia comum é que a ocorrência de condições ambientais extremas reduziria a diversidade de estratégias de vida na floresta. O resultado dos experimentos, entretanto, contrariou essa expectativa, surpreendendo as pesquisadoras. Em uma simulação com 50% menos chuvas do que as condições normais, o Caetê indicou que a diversidade de estratégias de sobrevivência aumentaria. Entretanto, essa diversidade maior não implicaria, necessariamente, benefícios ambientais.

As pesquisadoras esclarecem que, em um cenário de menos chuvas, as plantas deixariam de reter tanto carbono nos troncos, região onde, proporcionalmente, elas o acumulam em maior quantidade, para estocá-lo nas raízes, favorecendo a absorção de água. “No fim das contas, teríamos uma floresta mais diversa, mas que estoca menos carbono. Isso é ruim, porque a capacidade de estocar carbono é fundamental para a regulação do clima naquela região e para a redução ou parao não agravamento das mudanças climáticas”, detalha Rius.

SIMULAÇÕES REVERSAS

O algoritmo permite também realizar estudos que relacionam as mudanças no ecossistema com outros fatores, como a forma com que comunidades locais, que dependem da extração de determinadas espécies, podem ser impactadas caso essas plantas deixem de existir e sejam substituídas por outras que se adaptem às novas condições.

Há ainda a possibilidade de simulações reversas, ou seja, quais estratégias as espécies precisariam desenvolver para que a floresta mantenha seus serviços ecossistêmicos inalterados, com os mesmos padrões de chuvas, de sequestro de carbono e com a mesma capacidade de regular o clima, entre outros. “Para além das mudanças climáticas, o Caetê permite explorar como a frequência de fenômenos climáticos extremos, como o La Niña, pode afetar a dinâmica da floresta”, menciona Cardeli.

O desenvolvimento do algoritmo Caetê é um dos componentes do AmazonFACE, programa internacional coordenado pela Unicamp e pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) com o objetivo de monitorar os impactos causados pelo aumento da concentração de gás carbônico atmosférico na floresta. Para isso, será construída uma grande estação de pesquisa a 80 quilômetros de Manaus, onde torres de 35 metros de altura serão dispostas em seis círculos de 30 metros de diâmetro, cada um com 16 torres. Elas serão ligadas a tanques de gás carbônico líquido e equipadas com sensores diversos.

Dentro dos círculos, a área florestal será exposta a uma concentração de gás carbônico 50% maior do que as condições normais, permitindo avaliar o que ocorre com as espécies nessas condições. A ideia é que o Caetê seja utilizado como recurso que complementa as análises realizadas em campo. “Com o algoritmo, conseguimos dar início ao experimento aumentando a concentração de carbono no ambiente, por meio da modelagem, e analisando como as plantas vão reagir a isso por meio do computador”, pontua Cardeli.

As pesquisadoras também comentam que a modelagem computacional auxilia na formulação de novas hipóteses de investigação e no preenchimento de lacunas existentes no conhecimento a respeito das espécies amazônicas. Cada nova informação aprimora o sistema, o que permite a projeção de cenários ainda mais factíveis. “Nossos modelos estão sempre em aperfeiçoamento, por isso o algoritmo está em desenvolvimento contínuo”, sintetiza Rius. 

Fonte: Jornal da Unicamp

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